quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Na prisão - Egona Schiele


Apesar de sua curta carreira, o pintor austríaco Egon Schiele (1890-1918) é um dos principais expoentes do expressionismo no início do século 20. Suas imagens distorcidas, em sua maioria de personagens femininas, revelam os dilemas causados pela transformação de valores do início daquele século.

A liberalidade sexual que se opunha ao moralista processo civilizador estava entre um dos principais itens da agenda naquele momento, e "Na Prisão", que Schiele escreveu a partir dos 24 dias em que esteve preso na Áustria em 1912, acusado de ter exposto trabalhos pornográficos a menores, revela que o artista não só foi um grande pintor como também um excelente escritor.

"Na Prisão" possui um texto nervoso, assim como nervoso foi o traço do artista. Ao receber material para desenhar e escrever, após dias na prisão, Schiele afirma: "Consigo trabalhar e assim suportarei o que senão seria insuportável. Para isso me ajoelhei, me humilhei, supliquei, orei, mendiguei, e teria ganido, caso não houvesse outra saída. Oh, arte! - O que não faço por você!".
Assim, em tom testemunhal, Schiele descreve sua estada forçada e incompreendida pela sua fala: "Se eu pelo menos soubesse por que me meteram aqui. Não pode ter sido por causa do desenho. Ou sim? Na Áustria, tudo é possível".

A publicação bilíngue, em português e no alemão do original, traz os 48 desenhos e aquarelas realizados por Schiele na prisão, o que confere caráter performático à obra. "Não me Sinto Punido, mas Purificado" é o título de um dos trabalhos, que ironicamente apresenta o material de limpeza do local acumulado num canto.

Schiele desenhou seus lençóis amontoados numa cadeira, uma laranja iluminada em meio à sua obscura cela, a porta que o liberaria para o mundo, representou-se com as vestes da prisão: "Constranger o Artista É um Crime, É Assassinar uma Vida que Está Germinando" é nome de outra aquarela.

"Na Prisão" acaba se constituindo manifesto pela liberdade de expressão e pela liberdade artística: "Não nego: fiz desenhos e aquarelas que são eróticos. Mas são sempre obras de arte, posso dizer isso, e as pessoas que entendem um pouco do assunto confirmarão com prazer. Outros artistas não produziram quadros eróticos?"

Preso em abril de 1912 e libertado no mês seguinte, Schiele morreria seis anos depois, vítima da gripe espanhola. "Não estuprei, não roubei, não matei, não incendiei; infringi a sensível 'sociedade' humana apenas e tão somente por meio... da minha existência", escreve o artista, colocando-se assim com um dos protagonistas das vanguardas modernas que misturaram arte e vida.

Serviço
Na prisão
Egona Schiele
Tradução: Claudia Abeling
88 páginas - R$ 47,00 (em média)
Editora Kadyc Editorial

Post tirado do Jornal Folha de São Paulo

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